Dois casamentos de menores desde 2018. O que diz a lei
Radio Latina 3 min. 06.02.2023 Do nosso arquivo online
Adolescentes casados I

Dois casamentos de menores desde 2018. O que diz a lei

Adolescentes casados I

Dois casamentos de menores desde 2018. O que diz a lei

Radio Latina 3 min. 06.02.2023 Do nosso arquivo online
Adolescentes casados I

Dois casamentos de menores desde 2018. O que diz a lei

A Rádio Latina falou com a Administração Judiciária e com o Okaju para perceber como funciona a lei num país onde as uniões de menores de idade são, na verdade, proibidas.

O ano de referência é 2018. Nesse ano, a lei criou o chamado juiz da família, que passava a ser competente por todos os assuntos relacionados com menores. E foram esses juízes que, desde então, validaram dois pedidos com vista a casamentos de jovens com menos de 18 anos de idade. No total, foram feitos três pedidos. Um foi chumbado, segundo dados revelados à Rádio Latina pela Administração Judiciária.

Em entrevista à Radio Latina, Charel Schmit, líder do Okaju, o comité para os direitos das crianças, lembra que a lei luxemburguesa proíbe os casamentos de menores desde 2014 . “Isso está na lei de Felix Braz, que legalizou os casamentos de pessoas do mesmo sexo”, refere. Esse texto legislativo resolveu também algo já há muito contestado por associações de mulheres. Até aí, a lei estipulava que os rapazes só podiam casar a partir dos 18 anos, mas as raparigas podiam fazê-lo a partir dos 16. Com a aprovação da reforma, o casamento de menores passou então a ser proibido, por lei, independentemente do sexo. Associações aplaudiram. Mas a possibilidade de um adolescente casar continuou a existir, ainda que apenas em “condições absolutamente excecionais”, como sublinha Charel Schmit.

Jovens a partir dos 16 anos podem fazer pedido ao juiz da família

Não é muito fácil definir os casos em que isso acontece. À primeira vista, a informação disponível nos sites oficias pode até induzir em erro. “Uma pessoa menor de idade pode casar-se, desde que tenha uma autorização do juiz da família”, pode ler-se no MyGuichet. Os pedidos podem ser feitos pelo próprio menor, pais ou tutor.

Apesar de assim ser, apenas casos muito específicos receberão luz verde. A lei indica que isso acontece apenas quando há “motivos graves”. Charel Schmit prefere falar em “condições excecionais”, que, frisa, não podem ser banalizadas.

E quais são esses casos? A gravidez pode ser um deles.

Poder permitir um relacionamento amoroso

O Okaju está do lado desta lei. Se por um lado se assume contra as uniões de menores, Charel Schmit explica que há realidades sociais muito complexas e que a vida de uma pessoa “não pode ser regida pelos textos do código civil”.

Uma união de menores é, às vezes, uma forma de, simplesmente, permitir a um adolescente estar num relacionamento amoroso. Um dos casos em que o juiz da família deu o seu aval a um pedido remonta a 2019. Em causa, uma jovem cujos pais, por questões religiosas, não podiam “conceber que estivesse com mais do que um homem ao longo da vida”, pode ler-se no resumo do processo, a que a Rádio Latina teve acesso. O documento indica também que “apenas o casamento lhe permitira estar com o [namorado] sem acompanhamento”. Após uma análise do caso, o juiz acabou por entender que autorizar aquela união seria do interesse da menor. “Poder viver a sua relação livremente como qualquer adolescente pressupõe, por necessidades culturais, que esteja casada”, lê-se ainda. Charel Schmit ressalva esta noção de “necessidade cultural”.

O juiz da família tem de se certificar de que se trata de uma “livre escolha do menor” e que não há pressões culturais, como por exemplo casamentos forçados.

Situações são “muito particulares”. Não pode haver sombra de dúvida

Schmit destaca “situações muito particulares”, como por exemplo entre requerentes de proteção internacional, em que permitir o casamento é uma forma de garantir o “superior interesse do menor”, a sua autonomia e independência.

Questionado sobre se estas exceções abrem as portas a matrimónios forçados ou casamentos por conveniência, Charel Schmit garante que nenhuma decisão é tomada de ânimo leve. Tudo é analisado e várias pessoas são ouvidas para garantir que o/a jovem não está sob pressões religiosas ou culturais. Tem de haver garantias quanto ao consentimento do menor.

O líder do Okaju faz também referência à Convenção sobre os Direitos das Crianças, que estipula a capacidade de discernimento das crianças e o direito a exprimirem a sua opinião.

Charel Schmit conclui resumindo que a lei proíbe, em princípio, o casamento de menores, mas permite exceções. O “levantamento da proibição” deve, por isso, ser uma via excecional para proteger os interesses dos menores.

Artigo: Diana Alves | Foto: Shutterstock